MADRÍ – O relógio na Arthur Ashe marca 12 minutos da final do US Open entre Carlos Alcaraz e Jannik Sinner. O espanhol lidera, com um break acima e tem 40-15. Ele começou com uma grande performance, condição essencial para que ele possa jogar como gosta.
Nesse momento, com Donald Trump ainda prestando atenção, ele saca no corpo de seu adversário, que devolve como pode, deixando a bola no meio da quadra. Alcaraz prepara a direita, avisando ao italiano da pancada que o espera. Mas é uma pegadinha!
Alcaraz imediatamente faz um gesto que obriga Sinner a inclinar-se para a frente. O tenista ruivo não caiu na cilada e conseguiu perceber claramente que Alcaraz não iria bater o forehand, mas sim o contrário: o murciano preparava um dropshot perfeito, o seu golpe característico.
No entanto, em questão de milésimos de segundo, Sinner descobre que havia outro truque dentro do truque inicial. Como os mágicos, que mostram a mão direita enquanto fazem o truque com a esquerda.
Em um piscar de olhos, Alcaraz deixa Sinner, Trump e todos os presentes sem palavras. Alcaraz queria que Sinner visse como ele preparava o braço para o dropshot, mas no final das contas ele executa uma direita com slice no fundo da quadra.
Watching Carlos Alcaraz hit these disguised drop shots NEVER gets old.
They try to read what he’s doing, but get sent to the other side of the court.pic.twitter.com/7mFHjy5nYL
— Swish 🍒 Tennis (@Zwxsh) January 27, 2025
Sinner, um dos jogadores mais equilibrados que já pisou em uma quadra de tênis, tropeça. Ele caiu na armadilha. Ele nem consegue fazer de conta que vai devolver a bola. O ponto é de Alcaraz.
A final do US Open não foi o palco da estreia desse truque de Alcaraz. Batizado nas redes sociais como fake dropshot, a falsa curta, esse golpe faz parte do repertório do espanhol há muito tempo. E não há dúvidas de que ele será visto novamente no torneio de encerramento do ano, o ATP Finals de Turim, no qual Alcaraz e Sinner disputam quem termina 2025 como número um do mundo.
“Carlitos, já desde muito pequeno, fazia coisas diferentes, golpes que não eram nada habituais”, recorda numa conversa com a CLAY Kiko Navarro, um dos seus primeiros técnicos e que ainda hoje treina crianças na mesma academia de El Palmar, a cidade onde nasceu o dono de seis Grand Slam.

“No tênis, acredito que tudo aquilo que poderia ser inventado já foi. Não acho que Carlitos tenha inventado nada no tênis, mas ele tem esse toque de genialidade que não se vê com tanta frequência. Sempre falei que não era normal a qualidade que ele tinha para fazer drop shots e voleios sendo um garoto”, acrescenta Navarro.
“Tudo o que ele faz hoje, ele já fazia quando era criança. Se você assistir a vídeos dele quando era garoto, em Tarbes, por exemplo (no prestigiado Les Petits As), ele tem a mesma direita, o mesmo voleio, a mesma facilidade e qualidade para fazer de tudo. É verdade que você aprimora a potência, retoca algumas coisas, mas a base já estava lá”.
“Eu me lembro dele fazendo o falso dropshot e, apesar de ser muito pequeno, ele o fazia muito bem. Quem o conhece espera o drop shot porque ele finge que vai usá-lo e então vão para a frente, em direção à rede. É aí que ele faz o slice com a direita, que executa com perfeição”, continua Kiko Navarro.
E ele tem razão: existem vídeos dele quando era criança fazendo esse falso dropshot, como o de uma partida contra seu amigo Dani Rincón em Lleida, quando tinha apenas 14 anos.
Assim fica mais fácil entender o que fazia Antonio Martínez-Cascales, diretor da academia de Juan Carlos Ferrero, quando Alcaraz treinava em suas quadras ainda muito jovem. Sempre que podia, o experiente treinador, que conhece muito sobre tênis, deixava suas tarefas diárias de lado para ir assistir aos treinos de Alcaraz. Ele se divertia muito.
“Eu ia ver os treinos e, sempre, em cada um deles, acabava vendo algo excepcional, uma jogada impensável. Nunca vi isso em ninguém. Valia a pena ficar duas horas lá, você conseguia ver coisas de outro mundo”, disse Martínez-Cascales em uma entrevista à CLAY há três anos.
Esse golpe de direita com slice era bastante comum no tênis de 50 ou 60 anos atrás, aquele das raquetes de madeira em que a tática era praticamente tudo. No tênis atual, com atletas versáteis, é muito difícil encontrar jogadores que saiam do padrão.
Sinner é o exemplo perfeito do tenista moderno: fisicamente é uma rocha, se movimenta como se fosse um antílope em qualquer superfície, saca a 210 quilômetros por hora sem nenhum esforço e quase não tem pontos fracos no fundo da quadra. Alcaraz compartilha muitas dessas características, mas acrescenta ainda aquele toque de gênio que é tão difícil de encontrar. O pulso requintado que acaba, inevitavelmente, lembrando Roger Federer, o tenista completo e o modelo que Alcaraz usava para se inspirar quando era criança, por mais que o tempo e o peso de uma lenda como Rafael Nadal o levem a dizer agora que seu ídolo desde pequeno era seu compatriota. Alcaraz sempre foi mais fã de Federer.
لا بس عن خاطري بعد وحدة ☺️ لأنه هاذي أروع fake dropshot في التاريخ 😉 https://t.co/8Hgx1ZtjJL pic.twitter.com/fIgZMCX0Em
— 𝗕𝗲𝗹𝗶𝗲𝘃𝗲✨ (@elmeer27) September 9, 2025
O suíço também enganou seus rivais algumas vezes com esse fake drop shot, mas não o usava com tanta frequência quanto Alcaraz: o espanhol o utiliza em praticamente todas as partidas.
Está se tornando uma marca registrada. Talvez devêssemos batizá-lo de “fazer um Alcaraz”, como acontece com as manobras e saltos em esportes como a patinação artística ou a ginástica. O mestre dos truques. Ele é o único tenista do mundo que, quando entra com a direita e com toda a quadra a seu favor, tem três opções: bater, dar um drop shot ou um fake drop shot.
Tudo acontece em questão de milissegundos no mundo de Carlos Alcaraz.





